Com certeza que sim: que o projecto é um projecto feito em velocidade de cruzeiro, sendo mais fruto do hábito (toda a gente sabe que tendemos pouco a reflectir sobre tudo aquilo que nos é habitual), do que de um qualquer desejo. Não se lhe denota qualquer tipo de investimento nem envolvimento, recorrendo a truques (coisa que nada tem de mal) de forma atabalhoada (coisa que tudo tem de mal), abstendo-se de algo mais do que cumprir os mínimos.
De certa forma é um projecto construído apenas à base de estereotipos (propositadamente alguém referiu Byrne na caixa de comentários), desligados, desproporcionados, desadequados; com um desenho pobre - é ver o Átrio ou o Auditório, como AM bem refere, mas também as padieiras e as soleiras, e aquela confrangedora pedra (uma má escolha, que anula a intenção expressa nos alçados desenhados) -, aparentando haver um problema de (in)capacidade de quem, deselegantemente, levou o projecto para a frente (será um curioso exercício tentar descobrir quem, por detrás da extensa lista de nomes espanhóis que fazem parte da equipa de projecto, é a aparejador de serviço).
Não há aqui, evidentemente, nada de grave. Ou nada de errado, sequer, a não ser essa banalidade que pouca justiça faz ao autor. Na verdade a única conclusão que poderemos tirar acerca do Paraninfo é a sua inutilidade. Para nós, para Bilbao, e para o próprio Siza.
A propósito deste tipo de coisas (sobretudo vindas de quem vem) recordo uma conferência do mesmo, que tive oportunidade de ver há um bom par de anos. A conferência, maravilhosa, foi toda ela ocupada apenas com um projecto: a Fundação Iberê Camargo. Nela foram mostradas todas aquelas coisas que ficam esquecidas pela gavetas dos ateliers, ou que normalmente acabam nos cestos do lixo: as dúvidas, os recuos e as hesitações (Iberô Camargo em forma de cubo, Iberô Camargo em forma de pirâmide, Iberô Camargo em forma de tolice), os desenhos feios e menos feios, os equívocos e, sobretudo, todo o tempo que se gastou a inventar aquela coisa.
A uma dada altura, já no fim da festa, alguém terá questionado Siza sobre a razão do evidente desequilíbrio entre o Museu - que, tal como afirma João Amaro Correia, é A Obra de Siza (quer dizer, depois daquilo nada mais há a fazer) - e outro projecto da sua autoria (não me recordo exactamente qual era a obra referida) terminda mais ou menos na mesma altura.
Depois de ter calmamente explicado o processo de encomenda do projecto do Brasil, e o (excepcional) envolvimento da fundação Iberê Camargo, Siza foi claro: aquilo que fez a Fundação ser aquilo que é - repito: o projecto que culmina e supera todo o percurso de Siza - deve-se, segundo o autor, a um facto da maior simplicidade: o envolvimento da parte de quem lhe pede o projecto, e o estímulo que esse envolvimento lhe provoca.
Quer dizer: não haverá boas obras sem bons clientes. Ou, dito estão de outra forma: todos têm o (Siza) que merecem.
ps. já agora, G. Byrne esteve nessa conferência. Embora não possa confirmar o seu grau de atenção para com tudo aquilo que por lá foi dito.
15 comentários:
Já ouvi conferências do Siza de grande excelência e outras que parecia um avô a repetir a mesma história de sempre, em que não o mandamos calar por respeito.
Apesar de tudo o que foi dito (e concordar absolutamente com a importância do cliente "cada um tem o (Siza) que merece", queria referir que o cliente além da dose de estimulo, tem constrangimentos económicos assim como de outras ordens, e existem outros condicionalismos, como os urbanos, nem todas as localizações são excelentes.
Também se podiam enumerar mais uns quantos auditórios desinteressantes na obra de Siza(assim como átrios e até mesmo espaços de biblioteca - onde pensava ser difícil criar um espaço menos interessante).
Acho até este momento interessante para discutir o modo de trabalho dos arquitectos em geral, se todos os edifico devem ser uma clara aposta de investimento para atingir "a Obra" ou pelo contrário andar para aí a "soutomourizar" (já não sei quem empregou este termo)a paisagem (e ainda por cima a copiar mal). Pois nem uma nem outra, e como já escrevi mais do que alguma vez me dignei num comentário, deixo um texto para quem quiser ler:
http://www.habraken.com/html/downloads/questions_that_wont_go_away.pdf
Não posso finalizar sem referir que para um edifício com repetição de truques está bem bom (se me permitem este tipo de avaliação qualitativa)! E sinceramente não acho que o volume/alçados estejam desproporcionados, quanto a isso um ultimo reparo, acho sim que na obra dos AS*, nomeadamente na biblioteca e nas residências nos Açores, o volume de um piso em cima das colunas várias (na biblioteca sobre a escada exterior, nas residências na zona da "floresta" de pilares), a relação das colunas com o volume que lhes carrega surge desproporcionada.
(o)arquitecto,
Muito obrigada pelo link
caro (o) arquitecto
quem faz a "excelência" (!?) das localizações são os arquitectos...
não há maus sítios, há maus arquitectos (ou maus projectos de arquitectura de bons arquitectos...)
a conversa dos "constragimentos" (económicos, dos clientes, etc.) é "choro" (mais uma vez Vítor Figueiredo) e acho por demais irónico que seja a propósito de uma obra do Siza que se venha a falar em "condicionalismos"... (será que alguém "desculpa" os "condicionalismos" na obra de todos os outros desgraçados muito mais "condicionados" que os starquitectos!?...)
todos os trabalhos devem ser uma aposta no melhor trabalho... "possível"...
o Siza, normalmente, "pode" muito mais que isto... (ou é preciso escrever isto com "h"!?...)
este trabalho não tem nada a ver com a "soutomourização" da paisagem (para isso podia falar sobre aquela obra para o Camilo...) tem a ver com a quase sempre infeliz ideia de resolver os problemas da cidade com o "nome" (normalmente não é mais que isso) do arquitecto
uma armadilha a que é difícil escapar mas da qual o Siza já se saiu (muitas vezes) muito melhor
os truques são bons!?...
se ainda não percebeu que esse é que é problema!?...
alma,
de nada.
AM,
quando falava de sitio, falava que eventualmente, em termos urbanos, aquela forma poderia ser a mais viável a resolver o que haja para resolver. Mas isso eu não sei, não conheço o entorno urbano.
Quanto ao resto, em quase tudo inteiramente de acordo, os constrangimentos não justificam a má arquitectura (quem conhece os interiores da Bouça, sabe que o Siza com materiais baratos resolve a coisa, geralmente nos soutomourizados é que a falta de dinheiro compromete a arquitectura).
Queria ressalvar tb que quando falei de "soutomourização da paisagem" não foi para aplicar a este exemplo, mas para tentar uma outra coisa mais abrangente, que pelos vistos não consegui.
eu também (ainda) não conheço o entorno (ou o estorvo) :) urbano
e também não conheço o programa em detalhe para criticar a solução (o "L" virado ao rio é uma solução muito escorreita...)
penso ter percebido a sua ideia sobre a soutomourização quando aplicada a uma arquitectura que deverá viver mais da repetição que da diferença (sendo esta obra do Siza em Bilbão mais um produto dessa repetição que da diferença da obra de Porto Alegre)
será que percebi bem!?
É qualquer coisa assim sim, mas em que a repetição não coincide de todo com a "soutomourização", pois este é um extremo, na maior parte das vezes, desqualificado.
mas isso não será assim a modos que a quadratura do círculo?
o santo graal do "tipo"?
com o Rossi acabou mal...
tipo? Rossi? não tarda nada estamos a falar do Quatremère de Quincy. Não, nada disto, estas coisas têm já meio século, fazem parte da história da arquitectura e estão no raciocínio arquitectónico por defeito e com peso e medida variáveis, já não há quem siga estas coisas como ideologia.
não tinha pensado no Quatremère, tinha pensado no Durand
a arquitectura é a sua história e a ideologia está de volta
para conferir em:
http://tempodascerejas.blogspot.com/2010/12/comecando-semana-com-uma-voz-da-luta.html
estava eu a re-ler umas coisas (velhas) e a pensar que isto de repetir sem regredir (souto de moura sem soutomourização) também podia ser linkado à excepção da "fanfarra" do Venturi (por oposição e complemento a uma arquitectura genérica...)
se isto estiver a ficar tudo muito esotérico o autor do blogue que intervenha
My friend AM,
explique devagarinho, s.f.f.:
"com o rossi acabou mal..."
não chegámos ao fim da história !
minha cara amiga :)
não sei se deva :)
queria dizer que o Rossi também teve a sua fase de soutomourização... :)
parece-me difícil, senão impossível, pedir a uma (qualquer) starquitectura que produza uma arquitectura mais "corrente", melhor, mais genérica, e menos "excepcional"...
uma espada de dois gumes, o dilema de Siza, em Bilbão
não se trata de pedir à starquitectura de produzir "corrente" (e isto de corrente requer alguma definição) até porque a maioria se sairia mal. Trata-se do papel da arquitectura em geral, da não starquitectura, muitas vezes desqualificada, porque queria ser starquitectura e não tem meios para tal (e aqui podemos bem esquecer os económicos, pelo que percebi, acho que é de acordo geral que o orçamento não interfere na qualidade).
A ideologia não está em questão, está sim qual a que se segue, ou qual a que se admite alguma contaminação. Não é um assunto que me preocupe até porque não faço parte da geração do "sit back" anda para aí em expos e confs.
Dando um salto sobre toda essa discussão paralela, apenas para referir que a relação entre as colunas e o volume de cima (da biblioteca, das residências...) seria desproporcionada, não fosse haver em cada um segundo plano a ocupar-lhe o vazio, garatido-lhes esse peso clássico que "(o) arquitecto) tanto parece valorizar. Mas apesar disso confirmo: há uma tendência (desviante) desses tais esses a.s* para a desproporção.
Quanto ao resto da discussão, apenas não percebi a referência (AM) a um tal de Camilo.
Do peso acho que consigo perceber depois de o referir, se calhar não é bem uma questão de desproporção, esses pontos apanham sempre a minha atenção no conjunto.
camilo, o castelo, branco
do siza
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