Quando as Catedrais eram Brancas, notas breves sobre arquitectura e outras banalidades, por Pedro Machado Costa

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O falso Körmeling

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Walter van Weelden, o comissário holandês para a Expo de Shanghai (eu sei que se devia escrever Xangai, mas parece estranho escrever assim: Xangai), deve ser um homem ambicioso. Só pode ser um homem ambicioso. Não fosse van Weelden um homem ambicioso, provavelmente não diria o que disse: We want the (netherland's) pavilion to be one of the top best pavilions in the Expo site.













Expo'2010 - Shanghay: Pavilhão da Holanda, também chamado de Happy Street; John Kormeling


Não é que a arquitectura holandesa não esteja em baixa (afinal é por isso que se lhes chamam Países Baixos), numa espécie de fim de estação. Mas isto já soa a exagero.

O problema aqui é no entanto pessoal: considero isto, do pavilhão Holandês, em mais nem menos do que uma punhalada no coração. Uma coisa à Dexter. Violenta. Sanguinária.
Uma traição na confiança que depositei, com todo o empenho, em John Körmeling.
Uma armadilha que me foi montada, depois de passar mais de uma década a apreciar, sozinho, a obra de Körmeling. De segredar, a poucos ouvidos, da sua existência. De passar o seu livro, subrepticiamente, a alvos por mim escolhidos com toda a precisão.





















Hot Spring: vertical plan that can be climbed. Twenty five meters hight. Parking place included; Körmeling, 2002; Matsunoyama


Durante muitos anos John Körmeling foi para mim uma espécie de ídolo secreto. Um herói privado. Daqueles tipos que se têm pendurados, em cartazes A3, ao alto, vincados a meio, nas paredes do quarto, ou a forrar os cadernos de esquissos, presos com fita cola; isto se me deixassem forrar as paredes do quarto com cartazes A3 (nunca deixaram) ou se tivesse, algures, cadernos de esquissos.





















Starting House: Boat racing track, Körmeling, 1992; Harkstede

Achava Körmeling um demiurgo. Um espécie de Miguel Palma holandês, mas ao contrário.
O último dos construtivistas. Ainda por cima vivo.
Um arquitecto inútil, que é a melhor espécie de arquitectos que se conhecem. Mais: o supremo arquitecto da inutilidade.
Um cínico humorado, o que é, evidentemente, um paradoxo. Um funcionalista desfuncional.
Um daqueles arquitectos que começa os projectos onde os outros normalmente acabam. Um ser humano dotado da clara compreensão das coisas urbanas, que sabia não agir até tudo se encontrar em perfeita linearidade.
Até hoje.




















Museumplein: The shortest and Widest motorway in The Netherlands: a relief for cars; Körmeling, 1998; Amesterdão


Tenho ainda esperança que haja um engano qualquer.

Talvez, quem sabe, o pavilhão seja uma falsificação.
É isso: um Körmeling falso.
Ainda por cima falsificado por ele próprio. Isso é, nem mais nem menos, a confirmação do génio de Körmeling.

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