Quando as Catedrais eram Brancas, notas breves sobre arquitectura e outras banalidades, por Pedro Machado Costa

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Da tendência para a reclinação e o seu desejo

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Por causa do que aqui foi escrito, temos vindo a ser regularmente visitados por leitores d'Os Cidadãos por Abrantes; um blog inteiramente dedicado a contrariar a Câmara de Abrantes no que diz respeito à decisão que tomou em encomendar a Carrilho da Graça o projecto para o Museu Ibérico.

Sendo claro, razoável até, o objectivo do Cidadãos por Abrantes - sustentado na ilegitimidade da adjudicação directa do projecto a Carrilho , e cuja saída legal terá sido a criação, em data posterior ao projecto, de uma Fundação que permitisse escapar aos contrangimentos próprios da encomenda pública -, o Blog sofre no entanto dessa ingenuidade que habitualmente rodeia este tipo de movimentos populares. Ali se vão esgrimindo argumentos escatológicos, com mais ou com menos apuro técnico, sobre o projecto de Carrilho, ao mesmo tempo que se permitem especulações pessoais e revelações sobre relações menos claras entre os vários envolvidos no processo, não se dispensando, aqui e ali, o delicado exercício da maledicência, facilitada que está a escrita pelo confortável e sempre errado anonimato que vai dispensando os seus autores de outros aborrecimentos.























Museu Ibérico, Abrantes, Carrilho da Graça, 2009 (imagem via Circo Natureza)

Não se sabendo ao certo o verdadeiro leitmotiv d'Os Cidadãos por Abrantes, uma coisa é certa: aquilo que dá pretexto ao seu esforço - dos seus autores e dos muitos outros bloggers que vão sendo ali citados por defenderem o fim do projecto do Museu tal como ele é hoje - revela-se, afinal, uma questão de gosto; facto esse que em muito vai explicando os recorrentes epítetos com que o edifício tendo vindo a ser nomeado: Pedregulho, Mamarracho, Caixote Horrendo, Bunquer Faraónico, Mastadonte, e todas os já habitais impropérios de cada vez que aparece alguém a propôr um projecto para um edifício com mais de três andares e com um aspecto mais ou menos esquisito. O problema de toda esta gente não é tanto a qualidade da proposta de Carrilho, mas a interpretação que dela fazem, nomeadamente do seu suposto impacto da paisagem.
Não é que seja de facto exigivel a um comum cidadão ter noções, por mínimas que sejam, daquilo que subjaz à ideia de paisagem; nem mesmo a capacidade de interpretar as ideias subjacentes a uma proposta arquitectónica. E no entanto, sendo embora um lugar comum, não deixa de ser estranho que a capacidade crítica em relação a um projecto se revele inexistente para tudo o resto; neste caso Abrantes e tudo aquilo que por lá tem sido feito nos últimos anos.
Evidentemente que as manifestações procuram um objecto simbólico; mas ainda assim seria expectável que estes movimentos de cidadania operassem sobretudo sobre o quotidiano, e não sobre um edifício que, pela sua própria natureza, será sempre uma excepção.

Do lado oposto os apoios são de peso: Pinto Ribeiro, ex-ministro da cultura, considerando-o um projecto de interesse nacional, e a Câmara Municipal de Abrantes - que, já agora, pretende que seja o mesmo arquitecto a desenhar as suas novas instalações - sublinha o nível internacional da equipa liderada por Carrilho; sem explicar porque razão é que a dispensou, a essa suposta equipa de nivel internacional, de trocar argumentos com seus pares num concurso aberto.

Evidentemente o que está em causa para a Câmara Municipal de Abrantes não é o projecto do Museu, mas antes ter - vá lá saber-se por que razão - um (dois, a contar com o edifício da Câmara) projecto(s) de Carrilho. E Carrilho, como qualquer outro arquitecto, serve-se desse pretexto para lá ir fazendo aquilo que quer, que pode ou que gosta.






















Museu Ibérico, Abrantes, Carrilho da Graça, 2009 (imagem de Luís Morgado)

E no entanto não há muito ainda a dizer sobre a suposta genialidade do projecto de Carrilho. Trata-se basicamente de um museu em altura - modelo já experimentado, não sem pontual sucesso, mas que condiciona fortemente a sua estrutura funcional -, cuja única explicação se deve - julgo - à ambição de alterar o skyline da cidade, criando-lhe um landmark que servirá principalmente o ego dos seus instigadores, mais do que os habitantes de Abrantes.
A maqueta é relativamente esclarecedora acerca do ortodoxismo da proposta, cujo maior interesse reside num vazio central que percorre os vários pisos do edifício. Resta saber se o generoso Edil viabilizará tal solução, que aparentemente colide com o cada vez mais apertado pacote legislativo que por aí anda.
Aparentemente o projecto pouco acrescenta à obra de Carrilho, apontado que está, cada vez mais, à contenção formal; dispensando-se, a proposta, de uma reflexão mais consequente e enriquecedora da natureza da sua própria arquitectura, como alías tem vindo a ser constante nos últimos projectos do autor, nomeadamente em Poitiers ou em Nancy - apenas para citar os franceses.

Se é verdade que os Cidadãos por Abrantes clamam, com legitimidade, a realização de um concurso público para o projecto do Museu de Abrantes, o curioso, aqui, é que a proposta de Carrilho tem grande probabilidade de ser o melhor projecto para Abrantes das últimas (largas) décadas. Facto esse que só vem confirmar alguma inépcia da cidade em se compreender a ela própria.

4 comentários:

AM disse...

o projecto parece, repito, parece, muito muito mauzinho
o problema (maior) nem sequer me parece ser aquilo que chamas de "contenção formal" (há "contenção formal" e "contenção formal"...) mas àquilo, que à falta de melhor chamaria (e chamei...) de "solipsismo"
é o que dá projectar para o umbigo
falta de umbigo(s), aliás, é a única coisa de que o projecto não aparenta... "falecer"...

Unknown disse...

O gajo até já domina a esala 1.5000 000: desenha sobre o mapa mundo http://www.jlcg.pt/index

Mas o mundo é tão curto e o espaço tão vasto. E as arquitecturas andam tão curtas...

alma disse...

Ahh :)
Avisem os Abrantinos quando estiver bom tempo avista-se Lisboa..:)

AM :) WOW :)))
mais Um BIG O

jraulcaires disse...

Acho o carrilho da graça um arquitecto muito preocupado com quesões plásticas, mas a quem escapa a dimensão humana da Arquitectura. São exercícios de estilo...

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