Quando as Catedrais eram Brancas, notas breves sobre arquitectura e outras banalidades, por Pedro Machado Costa

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Alguém insinua que a Escola de Hering pertence a essa mão (meio) cheia de obras excepcionais feitas nos últimos anos. Certamente que sim. Ou pelo menos gostaria que assim fosse.
Gostar por gostar: gostaria mais ainda de estar em condições de afirmar que a capacidade de invenção de Hering encontraria paralelismo em projectos cujos pressupostos de algum modo lhe são similares.

Por isso, gostar por gostar: gostaria de poder afirmar que nas nossas 5 Escolas 5 Áfricas encontraríamos razões para crer que a arquitectura portuguesa teria capacidade para ultrapassar os seus próprios dogmatismos, mostrando-se disponível para inventar uma outra coisa.
Gostar por gostar: gostaria então de estar em condições de afirmar que as respostas da comitiva portuguesa à Bienal de S. Paulo procuram estabelecer um outro grau de relacionamento entre aquilo que são as condições dos 5 países onde se intervém e o potencial que a arquitectura ainda detém, sendo capazes de criar modelos de excelência, que pudessem servir, de forma inteligente e criativa, os fins para que foram pensados.

Fazer escolas em países cuja escassez implica ainda grandes e graves limitações para aqueles que aí habitam equivale a um acto de extrema generosidade. Inegável. Mas tornar essas escolas em momentos especiais - como especial é a escola de Hering - equivaleria a assegurar que a educação implica muito mais do que ter um espaço para estudar. Simplesmente porque a importância da educação reside, em muito, no modo como o mundo nos é apresentado, mais ainda do que a maneiro como ele nos é explicado.

Amanhã iremos ter a oportunidade de ver cinco propostas para cinco escolas em África, pensadas por cinco autores portugueses.
Nelas vão estar presentes os fantasmas mais ou menos recentes da nossa própria arquitectura: caixas brancas, abstractas, assentes em muros contínuos; estruturas modernistas a lembrar, não sem algum romantismo ou ingenuidade, os anos de ouro da arquitectura ultramarina [aquela, que tão bem copiava os brasileiros, com grelhas, pilotis, e tudo o mais]; ou aproximações de tom regionalista, melhorando, com algum eruditismo, modelos e técnicas locais.

A pergunta que nos resta fazer: porque é que a generosidade de Hering é ainda caso único?

Muito com pouco

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Meti School, Radrapur [Bangladesh], Anna Hering e Eike Roswag, 2005


Ao contrário, no Sul, as regras são outras. As necessidades também. Como se não houvesse espaço nem tempo para outra coisa que não o assegurar da precariedade. Mas às vezes não é assim. Ou então é errada a ideia que nos diz que a precariedade não detém em si mesma a capacidade de superação.

Apontar para cima

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Não é concerteza por falta de vontade ou de empenho. Nem de jeito, entenda-se. Muito menos uma questão de não se gostar daquilo que se faz. Gosta-se, concerteza. E muito. Também não resulta de ignorância ou de desconhecimento.

O problema da arquitectura deve-se, demasiadas vezes, ao facto de, desde o princípio, se apontar para baixo. Para o baixo-ventre.

Sei, claro, de boxeurs que fizem longas carreiras a dar murros no estômago. Sobem para o ringue e logo se encostam ao adversário, socando-o sem levantar as mãos. Em socos curtos, com apuro de anos de treino. À espera que não aconteça nada de muito especial, e no fim a soma dos pontos do júri lhe permita, finalmente, fazer aquilo que até então tinha sido abafado pela razão: levantar as mãos. Genta há que vive toda a sua vida assim. Confortável com os pontos, levantando as mãos só no fim, depois de tudo se confirmar.



















Por outro lado pode até ser que apontar logo à cabeça tenha os seus riscos. Nem que seja por nos tornar demasiado expostos. Frágeis. Mas é que um bom soco é exactamente isso: levantar as mãos, apontar para cima, e bater com força. Com toda a força. A acreditar no K.O. Mesmo quando isso desiquilibre os momentos a seguir. E nos faça poder cair.
Pode ser, por isso, que a consequência seja a derrota. Uma derrota imensa. Sangrenta e dolorosa. Mas pelo menos as mãos não esperaram pelo fim: ergueram-se no momento certo. A apontar para cima.

Daí conclui-se: embora um adversário mais alto implique um risco maior, certo é que o facto de o termos à nossa frente amplia, em muito, a hipótes de apontar bem lá para cima. A lei aplicar-se igualmente ao boxe. Embora no boxe o adversário não seja propriamente uma invenção nossa.

Teoria da Arquitectura

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Claudia Schiffer, Campanha Dom Pérignon '95, Karl Lagerfeld

[Zumthor] é como um homem que decide casar e anda à procura da mulher mais bonita de todas. É um esteta, sacrifica tudo à beleza e depois os edifícios ficam todos lindíssimos mas é como almoçar com a Cláudia Schiffer. É bonita e pronto.

Eduardo Souto de Moura entrevistado por Laurinda Alves, i, 5 Out.'09

[agradecendo a informação a HN, um fervoroso adepto de Laurinda Alves]

Canavilhas

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Pode até não ser relevante para aquilo que se faça o sítio, qualquer que ele seja, onde se cresceu. Mas é óbvio que tudo isso se altera no momento em que o acaso implica que se cresça já não num sítio qualquer, mas antes nos Açores. É que os Açores não são um sítio qualquer. Na verdade não são sítio algum. São antes uma espécie de ideia.
Dessa forma crescer nos Açores implica de certa forma crescer numa ideia. Ora: tal facto tem, comprovadamente, sido relevante para aquilo que se faz. Ou nesta caso para aquilo que se irá fazer. Pelo menos assim se espera.

A queda

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O Triunfo de Galateia, Rafael, 1511

ORDOS Project ha tenido la posibilidad de marcar un punto de inflexión, de abrir una puerta hacia el futuro, pero ha culminado convirtiéndose en un cementerio de cadáveres jóvenes.

Ordos 100: Finales, no principios, Fredy Massad y Alicia Guerrero Yeste, in Exit Express 46, Outubro '09; publicado parcialmente no btbW.
Se não estou em erro é o Pedro Gadanho que nos costuma brindar com uma história do La Haine, sempre que se falam de coisas como esta: C'est l'histoire d'un mec qui tombe d'un immeuble de cinquante étages au fur et à mesure de sa chute il se répète sans cesse pour se rassurer: jusqu'ici tout va bien, jusqu'ici tout va bien, jusqu'ici tout va bien... mais l'important, c'est pas la chute, c'est l'atterrissage.

Mau Tempo no Canal

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Esta Arquitectura É!, Esta Arquitectura Não ! [mais conhecido como Senhor Ministro!], Manifesto Modernista, João Correia Rebelo, 1956, aqui em re-edição facsímile IAC 2002

De certa forma é irónico: Ponta Delgada terá sido a única cidade portuguesa que se viu envolvida no também ele único manifesto de arquitectura moderna que há registo em Portugal. E no entanto Ponta Delgada é, provavelmente, a cidade menos moderna que se conhece.

A primeira explicação credível que terei ouvido para essa ausência de modernidade de Ponta Delgada veio da boca de um ilustre açoreano [palavra que se escreve com i, em vez de e; sem nunca lhe ter percebido a razão]: António Machado Pires; homem versado nos Maus Tempos dos Canais, para além do mais fundador da Universidade dos Açores.
Dizia Machado Pires que, por falta de contacto com o resto do mundo, o arquipélago conduziu durante séculos os tempos medievais que o descobriram; passando por isso ao largo dessa modernidade que só iria chegar num tardio séc. XIX, pela mão de uma pequena - mas ainda assim ambiciosa - elite que, entre outras coisas, se tinha decidido a construir a paisagem natural pela qual São Miguel é hoje reconhecida.

Não é que a modernidade não tenha existido nos Açores. Mesmo que tardia, existiu. E em força. Só que essa força foi toda ela canalizada para a reinvenção da mecânica paisagista da ilha, num misto de idealismo romântico e de modernidade calculista; pondo de parte – por evidente constrangimento ou por simples inutilidade – os tecidos urbanos.

Anos depois, num adiantado séc. XX em que metade da Europa se via a braços com esses frigoríficos brancos que se propunham higienizar o seu quotidiano, Ponta Delgada optava – sem qualquer hipótese de escolha, entenda-se – por seguir à letra os paradigmas de um Estado Novo muito pouco interessado em actos revolucionários; renovando-se à moda de um Português Suave de tom regionalista [isto é: com basalto a recobrir os betões que já ninguém dispensava].
Ainda assim, nada de muito diferente se passava por aí, sobretudo se comparássemos Ponta Delgada a qualquer cidade média portuguesa: novas praças abertas, monumentos limpos de incongruências históricas, arcadas e beirados. É aqui que entra em cena João Correia Rebelo, herói moderno; descontextualizado – como aliás o são todos os heróis modernos, com seu grito de guerra: Esta Arquitectura Não É! – apontando veementemente para o Teatro Micaelense, um belo exemplar de cine-teatros de beirado pastiche; daqueles que cresciam como cogumelos um pouco por todas as cidades médias -, e Esta Arquitectura É! – mostrando que a arquitectura erudita regional é uma outra coisa.

Correia Rebelo insurge-se, por escrito e desenhado, contra aquilo que apelida ser um embotamento total do senso poético das formas, renegando o desprezo absoluto pelas novas coordenadas em que se situa a vida do homem contemporâneo manifestadas por essa nova arquitectura micaelense, razão pela qual Rebelo afirma nada haverem – os autores dessa arquitectura, entenda-se – entendido da mensagem da tradição.
Depois, elegantemente, Correia Rebelo, chama, a essa renovação urbana e arquitectónica de Ponta Delgada: medíocre, indigente, cúpida e, claro está, falsamente regionalista. Se é verdade que a história viria a dar razão a Correia Rebelo – autor do mais modernos dos exemplares da arquitectura acoreana: a Pousada da Serreta, na Terceira [1968], e de um punhado de outras obras do mesmo tom – tal facto não o terá ainda assim isentado de cumprir, até ao fim dos seus dias, exílio por terras do Canadá, onde viria a falecer, já em 2006.

Libertada da incómoda presença desse moderno panfletário, Ponta Delgada lá pôde seguir o seu tão almejado zeitgeist continental; se bem que por pouco tempo. Porque à medida que Portugal [continental] se desamarrava das contingências dos largos anos de uma ditadura arquitectonicamente desinteressante; os Açores – e com eles, Ponta Delgada – paravam. E paravam sobretudo por falta desse dinheiro que terá permitido pôr em prática esse crescimento selvático das cidades, pequenas, médias ou grandes em Portugal Continental.
Dir-se-ia, não sem razão: foi essa paragem que salvou Ponta Delgada.

Esta Arquitectura Não é! Esta Arquitectura É!, ou o magistral malogro de Correia Rebelo [excerto], nas bancas com a última A21.

ps. alegadas razões editoriais da A21 levaram a que o texto original fosse publicado sem 15 das imagens que o ilustravam. Às que sobraram, faltam-lhes as respectivas legendas. Também o título foi reduzido.

How to choose your own architect

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I heard he had done a football stadium in a cave and thought that he was particularly imaginative.

Rogers?

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Maggie's Centre, London, Richard Rogers, 2009

Admito total incapacidade em compreender a mente dos que premeiam, mais até do que a dos que são premiados.
Neste caso, aparentemente, até os que premeiam admitem total incapacidade para compreender os premiados.

Das cidades lúdicas e higiénicas.

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Bem sei que isso pode ser sinónimo de romantismo decadente. Uma coisa é certa: é sinal de alguma idade. É que sou do tempo em que se por acaso apanhássemos o metro na estação [por exemplo] do Rossio, só nos podíamos apear lá para os lados da Rotunda, porque todas as outras estações eram mais pequenas do que o próprio comboio, o que fazia com que a última carruagem [por sinal aquela onde viajávamos sempre] ficava dentro do túnel. Bem sei que isto foi há já muito tempo. Na verdade era criança. Pequena.
Deve ser disso: das memórias de criança pequena serem poucas, mas graciosamente resistentes. O que é certo é que, por vezes, sobretudo nas estações mais vazias, ainda associo o metro àquelas galerias em arco, revestidas de pastilha verde parda, cinzenta de fuligem, com um vago cheiro a urina, que se misturava, no ar, com o fumo dos cigarros que toda a gente acendia enquanto esperava pelo comboio. Havia nelas um hálito acre, quase desagradável, que depois era compensado pelo aroma do café torrado, que se espalhava pelas ruas da cidade; isto quando ainda haviam torrefações de café um pouco por toda a Lisboa.

Já há poucas estações assim. Velhas. Sujas. A cheirar a urina e tabaco. Com gente estranha e senhoras a a carteira junto ao peito, agarradas pelas duas mãos. Pelo menos em Lisboa. Há-as, claro, em todas as outras cidades; embora devidamente vazias do fumo do tabaco. Do resto, tudo nelas se vai mantendo com alguma invariabilidade: a urina, a fuligem que tudo acinzenta, os cartazes rasgados. Uma ou outra luzes fundidas. Tubos a passar em todo o lado. Algum medo de olhar para os outros também. Podemos encontrá-las, a estas estações que têm escapado ao ímpeto renovador dos arquitectos e dos políticos contemporâneos, nas linhas que mais longe estão dos centros das cidades; como aquelas paragens de RER que servem sítios chamados de Gennevililiers, de Marne-la-Vallée ou de Bourg-la-Reine, já longe do alegre e aparentemente civilizado buliço de Paris. Também as há em Londres, e em Moscovo; até porque são afinal poucas as estações do metro de Moscovo que se parecem com palácios.
Na verdade a única cidade que as soube manter, a quase todas elas, decadentes, confusas e despreocupadamente funcionais é Nova Yorque. São fascinantes as entranhas das estações de Nova Yorque. Bem ao lado dos luxos da Grand Central há uma que cruza três ou quatro linhas, onde temos que baixar a cabeça para não bater nuns tubos ferrugentos, que pingam qualquer coisa parecido com água. Os próprios comboios dispensas por segundos a luz, cuja intermitência cria curtos mas inspirados lapsos de tempo durante as viagens. E ouvem-se ruídos pouco apropriados a quem já esqueceu a revolução industrial. Colombus Circle por exemplo: se lá em cima já nada se parece com as imagens nocturnas de Taxi Driver, aposto que a estação continua a mesma dos tempos em que Scorcese era bom realizador.

Não é que não aprecie essa tendência de tornar as estações numa espécie de lugar de lazer. Quer dizer: gosto de [tentar] acompanhar as frases escritas a caligrafia fina nos azulejos da estação do Parque; até porque a espera, que no passado serua acompanhada por um cigarro que se deitava, aceso, para a linha mesmo no momento em que a carruagem da frente ia a passar, se tem vindo por este dias a tornar mais monótona. Desde que é proibido fumar em lugares públicos. Mas é que, enfim, as estações cada vez mais parecem querer ser lugares, em vez de quererem parecerem aquilo para que foram feitas. As estações não são lugares. São máquinas. E, admito, pode ser que seja um romantismo tardio: mas gosto que as coisas pareçam aquilo que são. Sobretudo se forem máquinas.

E por isso esta crescente tendência para tornar lúdicas estruturas que por princípio não o são, sobretudo as tais estações - de metro, e de comboio - se tornam coisas muito pouco naturais. É certo o argumento: as coisas ficam muito mais agradáveis de usar. Mais verdes, mais sustentáveis até. Floridas e higiénicas, como aqueles anúncios dos pensos da Evax.
Não tenho nada contra as flores e as mulheres felizes, entenda-se. Apenas desconfio que aquela altura do mês está nos antípodas dos sorrisos das raparigas giras, contentes, e aos saltos. O mesmo se passa nas cidades: não é preciso andar sempre a sorrir, contente e aos saltos.


























Vem isto a propósito de uma curiosa imagem [cuja origem infelizmente se perdeu, pelas memórias deste laptop], com um sujeito mesmo muito parecido com Mayakovsky, num lugar que aparenta ser a High Line. A imagem é curiosa primeiramente pelo facto de ter sido fotografado em Nova Yorque, não fossemos nós entretanto ter descoberto, não sem alguma surpresa, que o poeta terá sido um dos poucos revolucionários russos que se terá dado ao luxo de passear nas mais finas metrópoles ocidentais [e até de ter tido um filho americano de uma emigrée branca, mas isso são já outras histórias]; tendo inclusivamente escrito uma obra chamada exactamente de A Minha Descoberta da América [Moe otkrytie Ameriki, no original], datado de 1925 [há quem diga '26].
Mas o que esta imagem tem de maravilhoso - para mim, entenda-se - é poder olhar para a High Line como nunca a tinha visto, e recordar aqueles poucos momentos em que por ela passei antes de se ter transformado num popular lugar de diversões urbanas.
Não é que não ache poder vir a gostar da High Line como ela hoje é. Com certeza que irei. Gostar. Mas é que me parece que um dia destes ainda transformam as cidades todas em paraísos. O que, entenda-se, seria um aborrecimento. Mais até do que ficar preso no túnel, sem poder sair da última carruagem do metro.

How to recognise different types of trees...

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Monty Python's Flying Circus: How to Recognise Different Types of Trees From Quite a Long Way Away, 1969. Repito: 1969. Há gente que tem quase quarenta anos e é mais nova do que isto.

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Cmia - estaleiro de obra, a.s*; fotografias de J.P. Tavares, 2009


De certa forma é pelos restos das coisas - aqueles restos pelos quais ninguém se interessa - que de algum modo as coisas se podem explicar. Não é que os restos em si sejam importantes. Não são. O problema é que, aparentemente, os restos dão muito trabalho.

Os despojos do dia

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As I say, I have never in all these years thought of the matter in quite this way; but then it is perhaps in the nature of coming away on a trip such as this that one is prompted towards such surprising new perspectives on topics one imagined one had long ago thought through thoroughly. I have also, no doubt, been prompted to think along such lines by the small event that occurred an hour or so ago - which has, I admit, unsettled me somewhat.

The Remains of the Day [excerto], Kazuo Ishiguro, 1989

Sobre a confusão entre arrojo e estupidez

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Igreja de São Francisco Xavier, Lisboa, Troufa Real [2009]

Depois não andem para aí a dizer que a igreja católica é uma instituição conservadora.
Não é. Não pode ser. É que há uma condição necessária ao conservadorismo [que, aliás, partilha com o progressismo]: a capacidade de pensar.

ps: A igreja de São Francisco Xavier encontra-se a fazer um peditório para ajudar à construção da coisa. No entanto é de notar: certamente já todos nós demos dinheiro para causas bem menos interessantes.

Da hereditariedade e dos seus equívocos

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Sabendo de casos em que a hereditariedade terá dado os seus frutos - como aliás nos recordou há bem pouco tempo Tiago Borges com os casos Rudolf/Valerio Olgiati, Jean/Bernard Tschumi, a que se podem acrescentar os nomes de Eliel / Eero Saarinen -, resta saber qual a melhor forma de lidar com o contrário disso. Quer dizer: o que fazer quando a hereditariedade se transforma num logro?















Centro Cultural Avilés, Esp., Ana Maria Niemeyer, 2008 [em construção]

Vem isto a propósito do pretenso projecto de Oscar Niemeyer para o Museu de Arte Contemporânea de Ponta Delgada, e da [infeliz] confirmação que a autoria de tão grosseiro esboço pertence a Ana Maria Niemeyer.
Para além de neta do arquitecto e directora da fundação com o mesmo nome, Ana Marie é, aparentemente, responsável pelos mais recentes projectos do atelier Niemeyer, entre os quais o Centro Cultural Internacional de Avilés, nas Asturias, que por acaso até é parecido com o futuro museu na ilha de São Miguel. O rol de trabalhos de Ana Maria é tão impressionante quanto trágico.

Não sabendo o que fazer com tamanha fac[h]ada [nas costas de Óscar], resta-nos imaginar que a futura colecção do Museu de Ponta Delgada incluirá pinturas de Paloma Picasso e instalações de Zoe Nauman.

Sobre a Inerrância

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Poder-se-ia dizer que estamos perante uma curiosidade sociológica: as obras da autoria de ex-colaboradores de Carrilho da Graça correm sempre o risco de se confundir com as obras do próprio Carrilho da Graça; concluindo-se, claro está, que a divergência não é propriamente a área de investimento prioritário deste atelier.
No entanto, para lá dos preceitos ideológicos e de todo o universo formal que estes acarretam, a coerência e a cadência tornam-se, aparentemente, uma virtude; o que de certa forma nos obriga a aceitarmos o valor de um sistema que se têm multiplicado através das várias gerações que passaram pela Marquês de Abrantes.















Estação Biológica do Garducho, Ventura Trindade, 2008 [foto José Manuel Silva, via HP]

Nesse sentido, a atribuição do FAD à Estação Biológica do Garducho premeia sobretudo a persistência e a inevitabilidade, mais do que propriamente o exercício da dúvida.
Não há aqui lugar a dúvida alguma, nem qualquer margem ao livre arbitrio; não fossem as palavras de ordem impressas por Fernanda Fragateiro nas paredes do edifício tornar a vacilação numa impossibilidade: acredite que a beleza é conhecimento, ou surgem as paisagem.
Também por causa destas frases - algo paradoxais, se pensarmos que têm origem numa artista como Fragateiro -, não me admiraria muito que o representante português no Júri FAD deste ano tivesse tido larga preponderância na decisão de premiar Ventura Trindade; que é o mesmo que dizer: premiar a inerrância.

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Marlene Dietrich, Irving Penn, 1948.

Outubro

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Falar sobre Irving Penn obrigaria, claro, a recordar o nú de Moss, a citar as icónicas capas da Vogue, ou a relembrar Miles. Haveria ainda que passar pelos outros corpos femininos, gordos, adocicados, tapados ou nem tanto. Mas na verdade tudo isso se tornou relativamente desnecessário.





















Mies, Seagram e P. Jonhson, Irving Penn [1917-2009], 1955.

Pei?

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Admito total incapacidade em compreender a mente dos que premeiam, mais até do que a dos que são premiados.

Sobre os delírios eleitorais e outros pecados mortais

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Esqueçam as minudências e as imprudências eleitoralistas em fecho de autárquicas. Tudo isso [regresso de Frank O. Gehry ao Parque Mayer incluído] se torna irrelevante a partir do momento em que o Açoriano Oriental [que, para quem não sabe, é o mais antigo de todos os jornais publicados em Portugal] anuncia a mais brilhante promessa arquitectónico-eleitoralista do século: Niemeyer.

















Niemeyer? Repito: Niemeyer.
Aonde? Em Ponta Delgada.
A fazer o quê? Um Museu de Arte Contemporânea.

Não é que não deixe de apreciar fantasias. Gosto de fantasias. Adoro fantasias. Sobretudo se forem fantasias açorianas.
A questão, apenas de pormenor, é que já há um museu de arte contemporânea planeado para uma outra cidade logo ali ao lado: a Ribeira Grande, com projecto de Mendes Ribeiro e da dupla Menos é Mais. E não me recordo de haver nenhum Saatchi atlântico, nem mesmo Berardo Açoriano capaz de encher com arte contemporânea mais do que uma salinha, daquelas mais pequenas. Quanto mais dois museus.
Poder-se-ia, claro, alegar que a ausência de uma colecção de arte contemporânea não exclui a duplicação de museus, mesmo que distem menos de 20Km um do outro. Evidentemente que não exclui: haverá sempre algum sítio onde ir inventar conteúdos, mesmo que sejam nesses misteriosos museus da macaronésia; embora, claro, corramos o risco de faltar público açoriano para tanto museu.

O problema aqui é no entanto outro: estarmos - aparentemente - perante o maior logro da história arquitectónico-eleitoralista nacional, não fosse o projecto evidenciar grosseira e despudorada falsificação de Niemeyer.
































Todas as imagens: proposta para o futuro Museu de Arte Contemporânea dos Açores, com anunciada [mas largamente duvidosa] autoria de Oscar Niemeyer, 2009. Agradecemos o envio da notícia a fonte devidamente identificada, mas que para o efeito permanecerá anónima.

Assunto em permanente acompanhamento. Claro está.


Sobre a retórica e o sentimentalismo

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Não que os outros dias fossem maus. E no entanto os dias que têm passado pelo Khiasma, poeticamente doseados, revelam-se excepcionais para aqueles que apreciam bom senso e sensibilidade. O responsável: João Amaro Correia.

Inquérito à Arquitectura Popular em Portugal #3

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Casa, Fonte Dom João, Junceira [2009]

Habitar Portugal

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Habitar Portugal 06/08, Exposição: Marina de Cascais, 4 de Outubro a 1 de Novembro.

Poder-se-ia concluir que grande parte da responsabilidade pela falta de discernimento como foram sendo pensadas as cidades e a arquitectura em Portugal é dos próprios arquitectos.
Esse fenómeno torna-se mais gritante com a visibilidade que a disciplina vem tendo; que faz com que o território seja mais e mais ocupado por objectos arquitectónicos que, para além da excepção de poucas obras ou de escassos autores, é pouco qualificada.
Aquilo que nos é oferecido, hoje, por parte dessa produção arquitectónica média sofre de voluntarismo em excesso. Um voluntarismo inútil. Exacerbado, muitas vezes inócuo. Um voluntarismo ingénuo, pouco dado a procurar registos que não aqueles que ela própria procura celebrar: a da excepção. Isto sem, no entanto, se aperceber que as condições que permitem tal excepção são, muitas das vezes, contrárias às suas próprias possibilidades.
A arquitectura portuguesa média é, hoje, sobretudo, um estereótipo. Uma coisa que procura repetir fórmulas, modelos e modos de pensar, institucionalizados pela arquitectura da excepção, que lhe serve de role model.

Para além da excepção
[trecho], no catálogo Habitar Portugal 06/08

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Miradouro, Museu do Vinho, Pico, Paulo Gouveia, 1999

A sua intervenção não é a de se calar perante o valor da envolvente, mas sim, com sensibilidade e inteligência, a de a manipular. Construir a leitura da paisagem, manipulando a percepção de quem a vê, é assim algo mais ambicioso e aliciante que a evidência da sua simples entrega. Aliás, a ideia e o prazer de construir é algo que o pequeno edifício respira.

Os Miradouros e o Mirante do Museu do Vinho [Trecho], crónica por Sérgio Fazenda Rodrigues para o Açoriano Oriental. As crónicas são regularmente publicadas no Açores 2010.

A casa dos sentidos

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A Casa dos Sentidos, Sérgio Fazenda Rodrigues, 2009 [Ed. Arqcoop]

Desses textos, que misturam sem qualquer tipo de preconceito ensaio crítico, descrição ou simples divulgação de objectos arquitectónicos, publicados regularmente em semanários de grande tiragem o revistas generalistas, irão despontar a partir da década de 80, revelando edifícios e seus autores, mas também outros modos de pensar e de olhar para as nossas cidades, para as nossas casas, os nossos teatros, as nossas ruas e os nossos cafés. Esses modos de pensar e de olhar as coisas do quotidiano de um outro ponto de vista: do ponto de vista do arquitecto.
Várias séries de crónicas, publicadas n’O Independente, no Expresso ou no Público (muitas delas, curiosamente, também compiladas e editadas sobre a forma de livro), procuravam divulgar aquilo que era o trabalho dos arquitectos, ao mesmo tempo que nos faziam olhar de uma outra forma para as cidades e os edifícios que habitam o nosso quotidiano. Manuel Graça Dias terá sido um dos autores mais profícuos nessa arte de dialogar em torno da arquitectura, em programas de televisão e de rádio, em jornais e revistas. A ele juntam-se nomes como José Manuel Fernandes – que, entre outras coisas, é responsável por um conjunto de textos-guia sobre cidades e, de uma outra forma, Jorge Figueira, Ana Vaz Milheiro, Nuno Grande ou Ricardo Carvalho; estes últimos ambicionando o papel de críticos de arquitectura, de onde chegaram a dar pontuações aos edifícios, tal como o fazem os críticos de cinema a um filme que tenham visto.
De certa forma o trabalho de divulgação da disciplina por estes e outros autores contribuiu para que aquilo que rodeia o acto de pensar ou de fazer arquitectura fosse um pouco mais conhecido de todos nós; desconstruindo algum desse olhar especializado que é ainda o principal instrumento de trabalho dos arquitectos.
Com alguma humildade Sérgio Rodrigues diria que os textos presentes nesta Casa dos Sentidos - todos eles publicados anteriormente numa crónica semanal do Açoriano Oriental - são isso mesmo também: textos com ambição pedagógica, que desconstrói o seu olhar – ele próprio o olhar de um arquitecto e um académico, e portanto o olhar especializado – em torno do que é o seu próprio quotidiano, numa terra que não é a sua (um Lisboeta nos Açores); que, entre outras coisas, lhe permite (acha ele), ter uma distanciação crítica em relação ao que vê.
No entanto isso não é bem assim. Porque, ao contrário da divulgação da arquitectura feita por esses e outros autores – todos eles arquitectos – junto ao grande público, os textos reunidos nest’A Casa dos Sentidos não querem ser textos de divulgação de arquitectura. Repare-se: não há, aparentemente, nada que Sérgio Rodrigues aponte em cada um dos seus escritos, que permita classificá-lo como crítico, ou como historiador, ou como teórico de arquitectura.
Não é que o autor deixe de o ser. Crítico. Historiador. Teórico. É-o, porque a sua condição profissional e a sua própria educação possibilitam-lhe passear com um notável à-vontade nesses três campos. Mas aquilo que trespassa o conjunto de textos aqui reunidos ultrapassa em muito a crueza da análise estritamente profissional; e é isso que distingue então A Casa dos Sentidos de todo esse conjunto de textos sobre arquitectura que referimos anteriormente.
É que, ao contrário desses – que em muito se dedicam a um exercício taxonómico explicado em linguagem corrente -, aqui, Sérgio Rodrigues opta por pairar sobre os fenómenos. A sua intenção não é, por isso, simplesmente, a de os explicar.

Saber ver a arquitectura [Trecho], Prefácio ao livro A Casa dos Sentidos, de Sérgio F. Rodrigues, com lançamento na Sociedade de Belas Artes, em Lisboa, 2 Out., pelas 18:00.

Chile

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Chile: Public Works 1997-2007 from 0300TV on Vimeo.


Entretanto do outro lado do mundo há um pequeno canal que vai informando a arquitectura chilena para lá das imagens que conhecemos. Chama-se 0300TV.

Apostar muito

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Setembro. Lembro-me. Era o nome de um bar em Haia. Com happy-hour e tudo. Tinha umas tiras de milho salgadas, que se mergulhavam num molho de pimentos. Depois ficávamos com sede. E bebíamos uma e outra cervejas. Era bom, o Setembro. Mesmo que sem hotel nem Galeria Comercial.

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