A Casa dos Sentidos, Sérgio Fazenda Rodrigues, 2009 [Ed. Arqcoop]
Desses textos, que misturam sem qualquer tipo de preconceito ensaio crítico, descrição ou simples divulgação de objectos arquitectónicos, publicados regularmente em semanários de grande tiragem o revistas generalistas, irão despontar a partir da década de 80, revelando edifícios e seus autores, mas também outros modos de pensar e de olhar para as nossas cidades, para as nossas casas, os nossos teatros, as nossas ruas e os nossos cafés. Esses modos de pensar e de olhar as coisas do quotidiano de um outro ponto de vista: do ponto de vista do arquitecto.
Várias séries de crónicas, publicadas n’O Independente, no Expresso ou no Público (muitas delas, curiosamente, também compiladas e editadas sobre a forma de livro), procuravam divulgar aquilo que era o trabalho dos arquitectos, ao mesmo tempo que nos faziam olhar de uma outra forma para as cidades e os edifícios que habitam o nosso quotidiano. Manuel Graça Dias terá sido um dos autores mais profícuos nessa arte de dialogar em torno da arquitectura, em programas de televisão e de rádio, em jornais e revistas. A ele juntam-se nomes como José Manuel Fernandes – que, entre outras coisas, é responsável por um conjunto de textos-guia sobre cidades e, de uma outra forma, Jorge Figueira, Ana Vaz Milheiro, Nuno Grande ou Ricardo Carvalho; estes últimos ambicionando o papel de críticos de arquitectura, de onde chegaram a dar pontuações aos edifícios, tal como o fazem os críticos de cinema a um filme que tenham visto.
De certa forma o trabalho de divulgação da disciplina por estes e outros autores contribuiu para que aquilo que rodeia o acto de pensar ou de fazer arquitectura fosse um pouco mais conhecido de todos nós; desconstruindo algum desse olhar especializado que é ainda o principal instrumento de trabalho dos arquitectos.
Com alguma humildade Sérgio Rodrigues diria que os textos presentes nesta Casa dos Sentidos - todos eles publicados anteriormente numa crónica semanal do Açoriano Oriental - são isso mesmo também: textos com ambição pedagógica, que desconstrói o seu olhar – ele próprio o olhar de um arquitecto e um académico, e portanto o olhar especializado – em torno do que é o seu próprio quotidiano, numa terra que não é a sua (um Lisboeta nos Açores); que, entre outras coisas, lhe permite (acha ele), ter uma distanciação crítica em relação ao que vê.
No entanto isso não é bem assim. Porque, ao contrário da divulgação da arquitectura feita por esses e outros autores – todos eles arquitectos – junto ao grande público, os textos reunidos nest’A Casa dos Sentidos não querem ser textos de divulgação de arquitectura. Repare-se: não há, aparentemente, nada que Sérgio Rodrigues aponte em cada um dos seus escritos, que permita classificá-lo como crítico, ou como historiador, ou como teórico de arquitectura.
Não é que o autor deixe de o ser. Crítico. Historiador. Teórico. É-o, porque a sua condição profissional e a sua própria educação possibilitam-lhe passear com um notável à-vontade nesses três campos. Mas aquilo que trespassa o conjunto de textos aqui reunidos ultrapassa em muito a crueza da análise estritamente profissional; e é isso que distingue então A Casa dos Sentidos de todo esse conjunto de textos sobre arquitectura que referimos anteriormente.
É que, ao contrário desses – que em muito se dedicam a um exercício taxonómico explicado em linguagem corrente -, aqui, Sérgio Rodrigues opta por pairar sobre os fenómenos. A sua intenção não é, por isso, simplesmente, a de os explicar.
Saber ver a arquitectura [Trecho], Prefácio ao livro A Casa dos Sentidos, de Sérgio F. Rodrigues, com lançamento na Sociedade de Belas Artes, em Lisboa, 2 Out., pelas 18:00.
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