Quando as Catedrais eram Brancas, notas breves sobre arquitectura e outras banalidades, por Pedro Machado Costa

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Armazém, The Chinati Foundation, Marfa, Texas, D. Judd, 1975 [?]

Por outro lado as coisas bem feitas têm [claro] uma outra beleza.

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Casa, Vila Marin [Vila Real], Jorge Figueira, 2005

Da ensaística generalizada

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Sinal dos tempos: a academização da arquitectura tornou-se uma inevitabilidade.
Há, evidentemente, arquitectos a mais para tão poucas ambições arquitectónicas. Pelo que as gentes nela formadas terão, mais cedo ou mais tarde, de encontrar escapatórias se em prática quiserem pôr todo um saber acumulado por anos e anos passados entre mestrados e doutoramentos. Por isso os mais ambiciosos dedicar-se-ão, com afinco, à ensaística; que dessa forma se tornará num fenómeno em crescendo; conduzindo a um estado de esquizofrenia, por incapacidade de decisão acerca da importância relativa do objecto a estudar. Chegará assim o dia em que o número de estudos e a quantidade de investigadores ultrapassará o número de fenómenos e/ou objectos e/ou autores relevantes a estudar, relegando a academia para a ensaística das generalidades. Esquecendo-se porém que ela própria se torna inútil a partir do momento que de propõe enfrentar uma generalidade; ou não fosse isso uma clara contradição de termos.

A Montanha Mágica

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Sanatório Paimio, Finlandia, A. Aalto, 1932 [imagem via Landliving]


Ciplox [500mg], Adrovent, Ciprofloxacina Teva [500mg], Beclotaide, Ventilan, Fluimucil [600mg], Omeprazol [20mg]: é incrível como em pouco menos de um século a química veio substituir certas necessidades arquitectónicas por uma mão cheia de pastilhinhas e sprays que se vão sugando de 8 em 8 horas, levando pelo caminho todo o potencial dessa linhagem da literatura hospitalar que pereceu com o fim dos sanatórios.
Não é que não se vá escrevendo, aqui e ali, sobre hospitais. Quer dizer: livros com histórias passadas em hospitais, com médicos e tudo. Hoje escreve-se, aliás, sobre quase tudo.
A questão é que as probabilidades literárias de se escrever algo passado num hospital são hoje similares às próprias probabilidades arquitectónicas de um hospital.

Poder-se-ia alegar a vantagem temporal de tal avanço. E no entanto o tempo de uma doença, hoje, nem sequer dá para ler um livro com mais do que 600 páginas. Quanto mais para o escrever. Quanto aos hospitais, não me lembro de achar nenhum decente, nos últimos 50 anos.
Deve ser por causa da química.

O arquipélago da insónia

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Questiono-me acerca da popularidade da autores cuja complexidade da obra faria adivinhar uma difícil relação com aqueles que a procuram apreciar. Veja-se Lobo Antunes: a sua escrita não será propriamente consentânea com a aparente adesão massiva aos seus livros.
De facto a obra de Lobo Antunes tem vindo desde há muito a adensar-se. A abstractizar-se. Tornando a leitura cada vez mais exigente. Há, cada vez mais, frases cujo acabar só vai sendo encontrado por muita atenção, páginas à frente. Palavras deixadas a meio. Ou começadas desse meio para o fim; sendo a sua complitude alinhavada por uma frágil, brutal estrutura, cuja conjugação é tudo menos evidente.
Ao mesmo tempo que o desenvolvimento da obra nos vai embrenhando num mundo que não sabíamos existir, a escrita desprende-se da sua própria origem, libertando-se da referenciação inicial.
É nesse momento que percebemos estar perante algo único.

Acredito, evidentemente, que as Universidades onde se ensina literatura passem, a determinada altura, pelos lugares comuns; investindo só depois no único. Aprender literatura não é tarefa evidente, pelo que se impõe sabermos-lhe primeiro o óbvio, nem que seja para depois o deitar fora.

E no entanto há aqui uma dificuldade: como é que se ensina literatura pondo de parte a sua complexidade? O problema torna-se ainda mais evidente se falarmos de arquitectura: como é que se explica Lobo Antunes a um estudante de arquitectura?

Anderson

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A única questão que aqui se me levanta é a de saber qual o preciso momento em que um filme deixa de o ser, para passar à categoria de monumento.

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Quando as catedrais eram laranjas

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Orfanato [Actual Berlage Institut] , Amsterdam, Aldo Van Eyck, 1960 [via NY Times]

Se por um acaso, repentinamente, decidíssemos passar uns dias na arquitectura holandesa, provavelmente íamos desde logo a Roterdão, à Fábrica Van Nelle [Brinkman, 1931], que é o mais ortodoxo dos modernismos holandeses, e o mais belos deles todos. Haveria necessidade de espreitar essas outras pequeníssimas pérolas da ortodoxia moderna: a Casa Sonneveld, do mesmo Brinkman, em 1933, e aquilo que hoje em dia é chamado de Museu Chabot [G. Baas, 1938], sobretudo se aficionados fossemos do Corbusier.
Não seria mau passear umas horas pela zona comercial desenhada pela Bakema [há por lá uma excelente livraria], ir ao Boijmans Van Beuningen [o original, claro], para só depois descer ao NaI [o edifício é do J. Coenen, de 1993, mas nada de extraordinário], comprar aí um ou outro livro [na melhor livraria de arquitectura da cidade], atravessar o Museumpark [desenhado pelo Yves Brunier] e relembrar o Kunsthal [Oma, 1992], que é ainda o melhor Koolhaas dos Paises Baixos.
Com tempo sobrante tentaria um capuccino [senão uma dormida] no Hotel New York [que foi, durante os tempos da migração holandesa para a América, o ponto de partida de toda essa gente], bem na pontinha do Kop van Zuid [isto é: se tivesse paciência para atravessar a Ponte Erasmus e todo a parafernália arquitectónica dos finais de '90, onde o Siza esteve - quase quase - para construir aquelas torres revivalistas], seguindo logo a seguir viagem de barco Maas abaixo. Há pelo menos uma carreira comercial que atravessa o porto de Roterdão até Hoek van Holland, que nos leva à obra prima do J.J.P Oud: o Kiefhoak, dos anos 30.
Se houvesse tempo sobrante, não faria mal nenhum subir o Euromast [é feio, mas de lá de cima não o vemos], para o melhor bird-eye-view sobre a cidade.

Em Haia: o museu da cidade, chamado de Gemeentemuseum pelos habitantes locais [Berlage, 1935], seria paragem necessária. Do Berlage, ainda em Haia, há uma bela igreja [em inglês chama-lhe Christian Science Church] a não perder, antes mesmo de ir ao tal Bijenkorf. Evidentemente que não se dispensa uma volta lenta pelo Punkt em De Komma [Schilderswijk, Siza, 1988] e respectiva Casa das Bicicletas. Se quiséssemos [muito] ver o primeira grande salto em frente de Koolhaas [1987], bastar-nos-ia entrar pelo Dans Theater adentro [valeria sempre a pena: os espectáculos são muito bons], olhando, já agora, para o edifício em frente, do Hertzberguer [acho].
Em Haia há, claro, bizarrias pós-modernas pouco conhecidas: Grassi, Graves, Cezar Pelli, Rossi, Meier, etc; bem como uma daquelas experiências onde juntam uma data de arquitectos para fazer uma rua nova [projecto do Koolhaas, com experiências de Hadid e seus pares]; evidentemente dispensáveis à vista e ao gosto.

Em Amesterdão iríamos ao incontornável Sheepvaarthuis [que é agora uma hotel onde se deve passar pelo menos uma noite] do Van der May, do de Klerk e do Kramer [o arquitecto do Bijenkorf de Haia], de 1913, e ao mais do que obrigatório Het Schip [outra vez o de Klerk, em 1920] - que é agora o museu da Amsterdamse School, não havendo por isso sítio melhor para começar a viagem.
Em seguida, o Berlage Institut [que ocupa um antigo orfanato desenhado pelo Aldo van Eyck em 1960] saber dos doutoramentos. Não esquecendo evidentemente a Openluchtschool [Duiker, 1930], embora para ver Duiker não dispensasse nunca o Sanatório de Hillversun [1928]. E já que nos encontravamos em Hilversun, passavamos o resto do dia [mas não chega] para ver todo o Dudok.
Ainda em Amsterdam: o já referido De Dageraat [novamente de Klerk], e todo o restante manancial da Escola de Amesterdão. E aproveitava o dinheiro sobrante para uma visita à Architectura & Natura.

Por fim: Delft. Muito curto: a Aula Magna da TU Delft [van der Broke, Bakema, 1966] e, claro, a obra-prima de Hertzberger: Montessori.

Para lá dos clássicos, teríamos, claro, a nossa vida facilitada pelo Mimoa.
Mas provavelmente não era bem a mesma coisa.

Obra d'oiro

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Casa Esmeraldina, Asuncíon, Paraguay, Solano Benítez, 2001


Rumores galegos dizem-nos que o próximo número da Obradoiro [n.º34] irá publicar extenso artigo sobre a obra de Benítez, incluindo a transcrição de uma conferência que o autor deu em La Plata em 2005 - que ajuda [mesmo muito] a perceber o trabalho desse paraguaio voador.

[ps. Se daqui a três ou quatro meses não tiverem dado com a dita Obradoiro, pode ser que vos mande -a pedido, claro - o respectivo pdf. Mas só daqui a três ou quatro meses. Até lá procurem-na nos escaparates habituais. Concerteza que esses bons galegos agradecem o vosso contributo.]

We are the world

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Agora já é oficial: Graça Dias, comissário português da Bienal de Arquitectura de S. Paulo, anuncia o leit motiv da representação nacional: 5 escolas portuguesas para as 5 ex-colónias africanas.
Teremos então a Escola Guineense, por Pedro Maurício Borges; a Escola Caboverdiana, por Inês Lobo; a Escola Moçambicana, por Pedro Ravara; a Escola Angolana, por Jorge Figueira; e a Escola São-tomense, por Pedro Reis. O séquito paulista é ainda coadjuvado por Alexandre Alves Costa, Ana Vaz Milheiro, Diogo Seixas Lopes, André Tavares, que melhor nos ajudarão a perceber cada uma das propostas.
O projecto expositivo é da autoria de Égas José Vieira.

A pergunta que [quase] todos fazem

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Elogia da filosofia para construir um mundo melhor

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Escreveu Jean-François Raux, num prefácio (d'um livro de Edgar Morin) intitulado Elogio da Filosofia para Construir um Mundo Melhor que a procura de verdades não se revela por uma correspondência directa com o absoluto, mas antes pelo consenso. Aquilo que é justificado, é-o de modo a que uma maioria possa de facto atingir algo de comum, tornando-o acessível.
Esta forma de verdade justificada poderá ainda ser melhor compreendida, se conjugada com as teses de Luc Ferry sobre o individualismo democrático.






















Rusakov, Moscovo, K. Melnikov, 1929 [via Art and Architecture]

Pode ser que sim: que a verdade precise de justificação democrática. Dando assim razão tanto a Raux como a Ferry.
Mas é que, aparentemente, a boa arquitectura tende a negar tal obrigatoriedade.

Da evidente relação entre Bartleby e Bartlebooth

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Actus Tragicus, Edinburgh, Staatsoper Stuttgard, Setembro 2009 [via The Guardian]

Não sei porquê. Mas de repente, ao ver esta imagem, lembrei-me do Percival Bartlebooth, naquele delicioso livrinho do Perec. É que a par de Bartleby, Bartlebooth é, de toda a literatura moderna, o personagem que melhor se relaciona com o sítio onde mora.
Poder-se-ia, claro, alegar que Bartleby não mora em lado nenhum; pela simples razão que o espaço onde conhecemos e acompanhámos o filósofo [sim sim, Bartleby é evidentemente um filósofo, a não ser que seja um artísta, daqueles que passam a vida a fazer instalações] é um escritório. Mas tal não é verdade. As pessoas moram no sítio que lhes é mais confortável. Evidentemente.

Miami (Ad)Vice

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O nome do senhor responsável por esta coisa chama-se Hilário Candela, nasceu em Cuba, e desenhou-a, à coisa, aos 27 anos.
A pergunta impõe-se: o que é que vocês fizeram aos 27 anos?


























































Miami Marine Stadium, Virginia Key, Hilário Candela, 1963 [fontes: Links nas imagens]

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Casa Berlingieiri, Punta Ballena, Uruguai, Antonio Bonet, 1947. [via Vitruvius, com texto de Haas Luccas, que vale a pena ler]

Note-se: Bonet nasce em Buenos Aires. Uma cidade onde faz frio, nem que seja de vez em quando.
Uma espécie de Finlândia. Mas ao contrário. O que ainda é melhor.

Norte ao contrário

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Dipoli, Edifício de Estudantes, Otaniemi [Finlândia], Remia Pietilä, 1966

A questão aqui é simples: provar a estreita relação entre o quantidade de frio e a qualidade das coisas que se fazem para dele nos abrigarmos. Não sendo, claro, mais do que uma mera suposição, dir-se-ia no entanto que alguns sinais advertem para a dificuldade de se fazer arquitectura ao sol. A questão torna-se evidentemente mais complicada quando começamos a pensar na América do Sul. Mas vendo bem, o Sul da América do Sul é uma espécie de Norte ao contrário. Facto esse que explica muita coisa.

[a]portoguese school

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Por falar no Habitar Portugal: anuncia-se, no Shrapnel, o lançamento do HP 06/08.

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Desejando as Catedrais ir ao encontro do rigor informativo veiculado pelo jornal público na pessoa da sua jornalista e especialista em arquitectura nacional, Alexandra Prado Coelho, cabe-nos sugerir-lhe a publicação da seguinte notícia:

Título:
Souto de Moura e Arx distinguidos.

Corpo:
O arquitecto português Eduardo Souto Moura foi distinguido pelo Habitar Portugal pelo Centro de Arte Contemporânea Graça Morais, em Bragança.
A distinção, que é atribuída pela Ordem dos Arquitectos, distingui igualmente o atelier português ARX pelo Conservatório de Música de Cascais.
Os promotores do prémio receberam centenas de projectos de arquitectos de todo o mundo, nas áreas de construção moderna, arquitectura paisagista e planeamento urbano.

A nova arquitectura

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A inefável e sempre atenta especialista de arquitectura do jornal Público Alexandra Prado Coelho informa-nos que:

O arquitecto português Eduardo Souto Moura foi distinguido com o Prémio Internacional de Arquitectura 2009 pelo Centro de Arte Contemporânea Graça Morais, em Bragança [...], o prémio, que é atribuído pelo The Chicago Athenaeum Museum of Architecture and Urban Studies, dos Estados Unidos, em parceria com o The European Centre for Architecture and Urban Studies, distinguiu igualmente o atelier português ARX pelo Instituto Politécnico de Setúbal [...]
De modo a dar ainda mais relevo à importância do prémio, Alexandra diz-nos que:
[...] os promotores do prémio receberam mais de mil projectos de arquitectos de todo o mundo, nas áreas de construção moderna, arquitectura paisagista e planeamento urbano.
Admito que não estava a perceber bem o teor da notícia.
Primeiro porque, apesar do destaque da notícia ir para uma arquitectura onde o branco é tom dominante e cada pormenor denuncia a assinatura do autor, haveria um outro distinguido [Arx]; facto esse que me criava alguma confusão.
Depois porque nunca tinha ouvido falar desse tal prémio.

Com o peso na consciência de ter sugerido a menoridade do Centro de Arte Contemporânea de Bragança, e o embaraço por tamanha ignorância fez-me, claro, descobrir que o The International Architecture Award 2009 é, segundo as palavras do próprio, o mais prestigiado prémio global para a nova arquitectura, arquitectura paisagista, interiorismo e planeamento urbano [the world's most prestigious global award for new architecture, landscape architecture, interiors and urban planing; no original]; embora na verdade só tenha três anos de existência.

O que Alexandra Prado Coelho se terá esquecido de referir foi, porventura, um pequeno - mesmo muito pequeno - pormenor: que o número de prémios atribuídos por essa nobre instituição ascendeu, apenas este ano, a 97. Noventa e Sete.

Resta-nos dar, a Souto de Moura e aos restantes 96 premiados, os nossos mais sinceros parabéns.

[ps. já agora uma pequena rectificação para os senhores do International Architecture Award: Souto Moura não é espanhol]


Possibilidades de terror

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Num pequeno texto datado de 1920 [compilado em 1995 num livro chamado On Architecture] Adolf Loos escrevia: The effect of works of genius on their contemporaries is not one of beauty, but of terror. Evidentemente que a falência do terror terá entretanto contribuído para a recuperação do bom nome ao qual associamos o termo génio. No entanto não devemos esquecer que o termo génio deverá ser usado com devida parcimónia, não vá o diabo tecê-las.

Infra-estrutura

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Field, Ithaca, Pezo von Ellrichshausen, 2009

Dir-se-ia, pelo exemplo, que as infra-estruturas são o que de mais importante existe numa cidade.

Da geração que perdeu a curiosidade

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A propósito do último JA [235: ser Rico] poder-se-ia afirmar que a (re)entrada de Manuel Graça Dias trouxe à revista mais ecletismo e heterodoxia: aparecem textos assinados por nomes pouco dados a estas coisas da arquitectura [Helena Matos ou Daniel Oliveira, por exemplo], artigos de fundo com um fôlego pouco visto em publicações regulares de arquitectura em Portugal, entrevistas bem dirigidas [a Helena Roseta, no JA 234] e abordagens bem mais terra-a-terra do que aquilo por que se pautava o anterior modelo [veja-se o discurso de Soutinho], com evidentes vantagens. E isso é bom.

No entanto há uma coisa que trespassa este novo JA, que vai confirmando um fenómeno que se tem vindo a observar numa geração [ a de MGD] que se supunha, hoje, estar no centro da mais interessante produção arquitectónica [escrita ou prática, tanto faz] em Portugal, mas que vem sofrendo de crescente cepticismo. Denota-se-lhe uma crescente ausência de curiosidade. Ou antes, o desvanecimento do sentido de procura que a marcou no seu inicio.

Graça Dias escolhe um [bom] tema para o JA. Logo a seguir desbaratá-o com Chipperfield e Souto de Moura; apostas mais que seguras para quem precisa de vender revistas de arquitectura, mas pouco mais que desinteressante no sentido de revelar esse outro mundo afastado do mainstream nacional, que tanto terá empenhado MGD no passado.













Casa em Santo Estevão, Souto de Moura, 2008 [?], [Via Arquitectura Hoje]

No editorial, Graça Dias faz dos casarões de Mulholland Drive o seu alvo preferido, chamando-os de tristes lugares comuns; sem nunca dar a perceber que o recurso à Casa que Souto de Moura desenha para Cristiano Ronaldo é exemplo desses lugares comuns: um “Palácio” encomendado ao arquitecto de sucesso por um novo-rico. Um "palácio" triste, desadequado, deselegante e solitário.
O exemplo torna-se caricato pela [aparente] ausência de qualquer tipo de qualificação do projecto; revelando, quem sabe, um autor em piloto automático, cansado, desligado.

NA verdade é difícil perceber este projecto. Como tem sido difícil perceber o imbricado percurso de Souto de Moura após a sua obra maior: o Estádio de Braga. Enquanto dele esperamos um grande salto em frente, desligando-se daquelas casas burguesas que lhe asseguraram a fama, o seu percurso teima em desdizer-nos; sobressaindo uma espécie de despegamento à própria arquitectura, que nos leva a sermos confrontados com objectos pouco próprios para uma autor como Souto de Moura. São de fácil vislumbre alguns outros exemplos disso: a Casa do Cinema, o Edifício da Av. da Boavista ou, claro, o Centro de Arte de Bragança [que Bandeira, surpreendentemente, não deixou de escolher para a Selecção do Habitar Portugal]. Entre outros.















Centro Cultural de Bragança, Souto de Moura, 2008 [via Habitar Portugal]












Edifício de Comércio e Serviços, Porto, Souto de Moura, 2007 [via Arquitectura Hoje]


Talvez seja próprio da idade. Uma espécie da desapontamento pela qual a geração de ’50 esteja agora a passar; que a faça perder a curiosidade pelo mundo que a rodeia. Essa geração que tem hoje a vida menos dificultada pelas encomendas institucionais deixou escapar-se-lhe algum optimismo, rodeada que está de atenções, e de oportunidades que, descuidadamente, deixa resvalar.

Graça Dias – um dos homens com mais curiosidade pelas cidades que o rodeiam – faz, tal qual Souto de Moura, parte dessa geração. Uma geração que centra a sua atenção sobre si mesma. Esquecendo-se que o verdadeiro interesse da arquitectura é a sua capacidade de superação e de surpresa. Nele é de estranhar a crescente tendência para a pacificação, atirando fora a fina ironia com que dantes olhava para as coisas e para as pessoas, descobrindo-lhes significados até então invisíveis aos olhos de todos nós.

A casa de Cristiano Ronaldo não tem significado algum. A ser consensual, deve-o apenas ao nome do seu autor. E no entanto não haverá crítico algum de arquitectura capaz de revirá-la, à casa, e pôr de parte (nem que seja por pouco tempo) o peso do nome do seu autor. Como não há, ainda, nenhum crítico que dispense de soletrar Siza por tudo e por nada [veja-se a mão cheia de entrevistas publicadas pela Arq./A à elite crítica: de Nuno Grande a Bandeira, toda a gente refere Siza]; sendo, aliás, os mais inesperados, os primeiros a fazê-lo.

E porquê? Porque tudo isto? Por falta de curiosidade, apenas.


[ps. Em relação ao assunto refira-se ainda os diatribes em redor da Casa de Souto de Moura n'O Despropósito: não sendo o texto de AM um perfeito exemplar de elegância crítica, ainda assim não deixa AM de pôr o dedo na ferida: A Casa de Ronaldo é um projecto menor, mesmo que seja de um autor maior. Sobretudo por ser de um autor maior. Curiosa é a violência de quem contrapõe, baseado na tese ortodoxa que o 2º (como se isto fosse um campeonato) melhor arquitecto português não pode ser questionado. Lá está: falta de curiosidade.]

Princípio de Setembro

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Reutaurante, Bufe, Terras do Bouro, António Portugal (1965-2009) e Manuel Reis

A importância das coisas que ficaram por fazer é quase sempre substimada, escondida que está por detrás da aparência que se celebra.
Neste caso, como em quase todos os outros, a relevância estaria profundamente ligada à permanência e à constância. Coisa que se demonstra, a partir de hoje, impossível.
Neste caso, como em poucos, é essa impossibilidade a actual com traidora, injusta para com a arquitectura.

Ora aí está

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uma boa pergunta. Ou antes: uma pergunta boa. De Teresa Veiga Macedo:

O império da moda instalou-se e depois das roupas assinadas chegaram as casas assinadas para uma cidade assinada, habitada por uma classe social assinada... Terá sido isto com que Richard Florida sonhou? Seria este o paraíso de Guta Moura Guedes? Um mundo onde tudo é desenhado e onde cada desenho remete para o nome brilhante de um autor?

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Bird's Nest, Hangzou, 2008 [via Gizmodo]

Try walking in my shoes

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Poder-se-ia concordar com a tese que diz que a popularidade da arquitectura só vem confirmar a sua própria inevitabilidade. Não devemos no entanto esquecer que a partir desse ponto (de não retorno) passar-se-ia a correr o risco de praticamente a espezinhar. À arquitectura.
Sem querer; ainda por cima.











Bird's Nest, Beijing, Herzog and deMeuron, 2008










Melissa Campana ZigZag Flat, 2008

Ressaca

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A rentrée toca toda a gente. Mesmo a gente que não se Mexia há já algum tempo: Lei Seca, na coluna do meio.

Do umbigo do mundo

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Torna-se-me evidente que a coincidência é o desígnio mais próximo do estado de graça quando alguém que não conhece Pynchon de lado nenhum se chega à montanha de livros lá de casa, tira de uma prateleleira alta e desarrrumada o V, abrindo logo a seguir uma página ao acaso e, sem querer, começa a ler:

[...] um menino que nascera com um parafuso de ouro no sítio do umbigo. Durante vinte anos consultou médicos e especialistas em todo o mundo, para ver se conseguia livrar-se do tal parafuso, mas sem êxito. Finalmente, no Haiti, encontrou um feiticeiro de vudu que lhe deu a beber um líquido malcheiroso. Bebe, dorme e sonha. No sonho, vê-se numa rua iluminada por lâmpadas verdes. Seguindo as instruções do feiticeiro, vira duas vezes à direita e uma à esquerda, a partir do ponto de origem, encontra uma árvore junto do sétimo poste de iluminação, toda coberta de balões coloridos. No quarto ramo de baixo para cima há um balão vermelho; rebenta-o e encontra lá dentro uma chave de parafusos com cabo de plástico amarelo. Com essa chave desaperta o parafuso da barriga e assim que isso acontece acorda do sonho. É de manhã. Olha para o umbigo e o parafuso já não está lá. A maldição de vinte anos foi por fim quebrada. Delirante de alegria, salta da cama e o cu cai-lhe ao chão.
Repare-se: o parágrafo nem sequer está no ínicio de nenhum capítulo.

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