Sem prejuizo de tudo o resto, haverá porventura uma definição, trivial, com que facilmente concordamos então: a que coloca a arquitectura como elemento participante em todos esses lugares onde nos sentimos bem.
No entanto a concordância acaba exactamente aqui: sentirmo-nos bem não é, entenda-se, comparável a ess'outro fenómeno, recorrente, extensível ao nosso quotidiano comum, que designamos por conforto. Simplesmente porque no conforto nada nos é exigido. Nele não somos postos em causa. Nem somos sequer obrigados a reflectir. O conforto é para estar; não é para ser.
Por essa razão torna-se aparentemente impossivel habitarmos arquitectura: no preciso momento em que ela se torna parte do nosso quotidiano, começamos a ocupá-la com o proveitoso desprezo com que costumamos tratar o que nos é banal, anulando-se aquilo que é a maior das suas capacidades: a de nos relembrar, constantemente, da nossa banalidade. Ora: dispensando-se a natureza questionável da arquitectura em prol dessa ideia de conforto, dispensa-se a sua própria génese; o que evidente a torna débil, dependente que fica (apenas) da sua desenhada elegância (essa elegância que, sabemos, muda ao sabor dos tempos).
Sendo a conforto um instrumento da matéria da utilidade, poder-se-ia portanto concluir não estarmos já em presença de um problema das qualidades do útil, nem mesmo de facilidades ou funcionalidades - até porque a nossa capacidade de invenção e de adaptação a um espaço, ou a um meio, ou a um objecto é tudo menos ínfima -, mas antes da forma de melhor propôr o desconforto. Se quisermos: de destruir o próprio conforto.
Não havendo qualquer tipo de desprezo pelo exercício prático da tese que lhe é oposta, deveremos no entanto abstermo-nos de tentar explicar a arquitectura pela suposta ética social que lhe é implicita. Ideia essa que evidentemente não se apoia em qualquer proposta que pugne pela ausência de ética na arquitectura, mas antes por se partir do pressuposto que essa ética está implicita a qualquer acto disciplinar, incorporando no entanto uma estrutura única, cujo sentido maior busca aspectos como a tentação e o desejo, o temor, a consciência da nossa grandeza ou da nossa pequenez; que nos fará, na melhor das hipóteses, sentirmo-nos acanhados.
Tenho por garantida a nossa concordância: quase sempre nos sentimos acanhados perante as obras que nos toldam os sentidos.
E esta é um das razões que explica a impossibilidade de a usarmos, à arquitectura, sem sapatos. A não ser que hajam brasas espalhadas pelo chão.
6 comentários:
E o "hino" à vertente inutil da arquitectura continua e a caça aos arquitectos "sociais" (cheios de ética) também...
Força Pedro.
deve haver para aí alguma confusão entre arte e arquitectura
Andas a escrever cada vez pior...
Ikaz talvez seja pouco útil o teu comentário!
Não dão aulas de historia da arquitectura na Luisada no Porto?
normalmente é assim, aparece um programa, depois arranja-se maneira de compor uma solução ao programa e ao desejo, depois temos os colegas da Câmara que não têm nada de desejo e apenas "funcionam", depois detalha-se, acompanha-se, fotografa-se e fala-se, nos meios institucionais e noutros como em alguns blogs. À parte deste processo e em alguns casos parte do processo há as variações ao tema.
Caro Karl Pax... Não faço ideia se na Lusíada do Porto dão ou não aulas de história, suponho que sim...
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