Quando as Catedrais eram Brancas, notas breves sobre arquitectura e outras banalidades, por Pedro Machado Costa

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Blind Date

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Encontrámo-nos na saleta junto à porta, intermediados ainda pela empregada que num instante se desvaneceu, permitindo apresentações cordatamente indecisas, entre mãos estendidas e tímidas ofertas de face inclinada.
De pé as palavras parecem sempre mais tremidas. Concordámos por isso em dispensar os martinis, passando de imediato à Sala Privada, velada a meia luz, mais propícia ao cruzar de olhares e a sorrisos de cumplicidade, enquanto nos decidíamos a revelar ou não as nossas verdadeiras intenções.

Como é hábito falámos de antigos amores e desamores, de traições e de desilusões. Tudo um quanto ou tanto dramatizado, como convém em ocasiões como esta.
Sorriamos incomodamente de cada vez que o silêncio ocupava o ar, e logo gastávamos os nossos trunfos, que misturavam humor eclético e fina ironia, de modo a não arriscarmos em demasia.
Não demos a provar os pratos que escolhemos, nem me recordo de brindarmos a nada de especial.

Por cima da mesa, entre carnes de sangue e copos manchados de vinho, nada de visível se terá passado para além de olhares cruzados, sempre fugazes, logo seguidos de tímidos baixares de cabeças e mãos enroladas em guardanapos de pano-cru.
Por momentos fiquei com a impressão de ter sentido algo a tocar-me, ao de leva, na perna; mas não vi outros sinais que me permitissem inventar espaço.

Antes da sobremesa ainda saímos para o jardim, a pretexto da partilha de um isqueiro; e no entanto o barulho da festa ao lado fez-nos recuar de novo para a luz.
No fim de contas, que dividimos irmãmente, recusámos gentilmente a factura.

Nenhum de nós insistiu em beber um último copo nos bares logo ali em baixo.

5 comentários:

João Amaro Correia disse...

bebi o meu antes.

j

alma disse...

LOL,
bem descrito !
como outsider "certificada" :) gostei muito !

apetecia-me ter continuado ...
e arrependo-me de não ter pedido un petit gateaux :)

tms disse...

Porra. Falhei...

AM disse...

é tudo (menos, imagino, aquela parte debaixo da mesa...) verdadeiro! :)
as nossas intenções são todas verdadeiras! :)

Tiago Mota disse...

Eu gostei.

Mas contado desta maneira até parece outra coisa...LOL... Pedro és um poeta do campo...LOL

abc,
T

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